quarta-feira, 11 de julho de 2018

Dinamarca se destaca por segunda menor desigualdade social na OCDE

Sistema de bem-estar social garante seguro-desemprego de US$ 2 mil por dois anos

COPENHAGEN - Suponha que você esteja desempregado há mais de um ano; não possui diploma universitário ou formação técnica profissional; tem que pagar a hipoteca de sua casa e seu cônjuge está perto de se aposentar. Nada disso é motivo de preocupação se você viver na Dinamarca, o país com a menor desigualdade de renda do mundo.
Lotte Geleff, que perdeu seu emprego como auxiliar de escritório em janeiro de 2013, vai receber US$ 1,902 de seguro-desemprego por até dois anos. Ela faz parte de um sistema nacional de assistência médica e educação gratuitas, cursos profissionalizantes, creche subsidiada, aposentadoria generosa, subsídios para combustíveis e pagamento de aluguéis para idosos.
E altos impostos.
A robusta rede de seguro social da Dinamarca ajuda a explicar por que a disparidade de renda — a distância entre a parcela mais rica e o resto da população — é a segunda menor entre as 34 economias mais desenvolvidas, de acordo com a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), perdendo apenas para a Eslovênia, cuja economia é bem menor.
Por trás de sua pequena disparidade de renda estão fatores que variam do maior peso tributário da União Europeia (UE) a um sistema que ajuda mão de obra desempregada a encontrar trabalho e aprimoramento. Eles são fatores que dependem em parte do envolvimento do governo — financeiramente e em outras frentes —, o que seria politicamente inaceitável em certas partes do mundo.
Causa e efeito são impossíveis de provar, mas os dinamarqueses parecem mais felizes do que as populações dos demais países industrializados. Oitenta e nove por cento dos dinamarqueses revelaram ter mais experiências positivas do que negativas num dia comum, segundo levantamento da OCDE — o maior percentual entre 34 países-membros da organização.
— Não temos filé na mesa todos os dias, mas estamos bem — diz Geleff, que vive próxima a Roskilde.

CLASSE MÉDIA RESISTENTE
Enquanto a distância entre os ricos e o resto da população está crescendo na maior parte do mundo industrializado, uma boa parte dos dinamarqueses se mantêm firmes na classe média. Quarenta e dois por cento da população de 4,6 milhões trabalhadores ganham uma renda anual entre US$ 36.700 e US$ 73.300. Apenas 2,6% ganham mais de US$ 91.000.
De acordo com a OCDE, os 20% dinamarqueses mais ricos ganham em média quatro vezes mais do que os 20% mais pobres. Nos Estados Unidos, por exemplo, os 20% mais ricos ganham cerca de oito vezes mais que os 20% mais pobres.

O príncipe dinamarquês Frederik com crianças no Dia do Esporte em Copenhagem: elite sem ostentação - HUSTAD KATINKA / AP


A ideia de um colchão social para os mais pobres patrocinado pelo governo tem uma raiz profunda num país com poucos sinais de ostantação da elite. Os membros da família real em geral levam seus filhos de bicicletas para uma creche pública. No último inverno, a premier Helle Thorning-Schmidt foi vista tirando neve em frente a sua casa em Copenhagem.
Com uma sólida rede de segurança social funcionando, o governo conseguiu convencer os sindicatos a aceitar um mercado de trabalho flexível. Sob o modelo conhecido como “Flexiguiridade”, as empresas podem rapidamente demitir empregados nos momentos de dificuldades. Os trabalhadores demitidos, por outro lado, recebem treinamento e orientação para obterem novas carreiras.
Esse treinamento faz parte da abordagem dinamarquesa da educação, que é gratuita para todo mundo, independentemente da idade, num país com 5,6 milhões de habitantes. Estudantes acima de 18 anos que vivem sozinhos podem receber uma mesada de US$ 1.028. Os que vivem com os pais, têm direito à metade desse valor.
IMIGRAÇÃO É PROBLEMA
A educação é de tal forma universalizada no país, que a Dinamarca sofre de um problema raro no exterior: a falta de trabalhador sem qualificação. O país não tem salário mínimo estipulado por lei, mas sindicatos e organizações patronais concordaram em um pagamento mínimo de US$ 20,3 por hora.
O professor de Economia da Aarhus University Torben Andersen vê a unidade política como um fator para a baixa desigualdade na Dinamarca.
— Não há fortes conflitos nem partidos e posições fortes, como se vê, por exemplo, na política americana — disse ele.

Mas algumas questões tendem a provocar tensões no país. Um deles é a imigração. Com uma taxa líquidade de imigração de cerca de 2,25 pessoas por mil cidadãos, a Dinamarca recebe quase a mesma quantidade de estrangeiros que os Estados Unidos. Muitos deles provêm de países em conflito no Oriente Médio, com poucas qualificações profissionais. Alguns deles penam para achar trabalho, o que leva alguns dinamarqueses a reclamar que os imigrantes se beneficiam da rede de bem-estar social do país sem contribuir para ele.
Esses conflitos fizeram crescer o apoio ao Partido do Povo Dinamarquês, que apoia políticas anti-imigração. Sua influência resultou no aperto das leis de imigração. Hoje, é mais difícil para estrangeiros obterem vistos permanentes e refugiados políticos trazerem suas famílias para o país.
Apesar do alto peso tributário, o apoio ao sistema de seguridade social permanece alto. Em uma pesquisa divulgada este mês, 38% da população afirmou estar “plenamente” satisfeita em pagar seus impostos. Cinquenta por cento se disseram “parcialmente” satisfeitas. No ano passado, outra pesquisa mostrou que 66% da população eram contra cortes no sistema de bem-estar social.

Fonte: https://oglobo.globo.com/

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